NÓS, OS SOBREVIVENTES

Você que nasceu antes de 1964 – esse ano dá arrepios em muita gente – é, antes de tudo, um sobrevivente para a geração dos “ecochatos”.

Creio que todos já leram os diversos artigos falando sobre isso, mas vou destacar algumas “armadilhas” das quais escapamos!

A primeira começava logo nos berços! Os berços eram pintados com tintas que continham chumbo e outros elementos nocivos aos humanos. Qual criança não mordeu as tábuas de seu berço? Principalmente quando começavam a nascer os dentinhos. Mas até hoje não conheci qualquer caso de um bebe que tenha morrido por morder o seu berço e se intoxicar com o chumbo!

O que eu mais ganhei quando era bem criança – sim, já fui criança, e até bebe – foram soldadinhos de chumbo! E eu adorava brincar com eles, e estou vivo! Desafiei a lógica dos ecochatos.

Andávamos nos automóveis nos colos dos pais ou avós, e nem por isso saia nos jornais que um bebe tinha morrido num acidente de transito por estar no colo, e não numa cadeirinha própria.

Quando começamos a nos alimentar, tomamos canja, com galinhas vendidas ainda vivas nos açougues – sim, eu peguei esse tempo -, sem qualquer controle da saúde pública! Ou tinha? Eu era criança e não sei sobre essas fiscalizações. Talvez fosse perigoso, e por isso acabou sendo proibido.

Mamadeiras e chupetas feitas sem qualquer controle e certificado do INMETRO! E nós chupávamos com gosto aqueles plásticos e borrachas nocivas!

Mas um dos maiores perigos que passamos foram as canções de ninar! Verdadeiras músicas de terror! Como não crescemos traumatizados com elas? Era somente por não entendermos as letras! Se entendêssemos estaríamos todos nos divãs dos psicanalistas!

Vamos ver somente algumas, as mais conhecidas!

Nana neném
Que a cuca vem pegar
Papai foi na roça
Mamãe foi trabalhar.

Pô! Você estava totalmente desprotegido se a cuca viesse mesmo lhe pegar! Nosso pai foi na roça e mamãe foi trabalhar! Naquele tempo as mamães nem trabalhavam, e o que papai ia fazer de noite na roça? Então era para assustar mesmo! Dorme logo, se não a coisa vai ficar preta, e você está sozinho!

Boi, boi, boi
Boi da cara preta
Pega esse menino
Que tem medo de careta.

Ou dorme logo ou vai encarar um boi de cara preta fazendo careta! Eu creio que simplesmente desmaiava de terror, e pensavam que eu tinha simplesmente dormido! Também nunca acordei num hospital por ter desmaiado! Quem foi o infeliz que ensinou ao boi fazer careta? Não sei se mando ele se confessar com um ecochato ou lhe dar os parabéns por esse feito circense! Poderia ter ficado rico, ao exibir o boi da cara preta fazendo careta!

E numa próxima noite lá vinha essa:

Bicho papão, sai de cima do telhado
E deixa este menino dormir sossegado.

O que essa porcaria de bicho papão estava fazendo no telhado? Esperando o papai ir para a roça à noite, e mamãe ir trabalhar! Será que ela rodava a bolsinha? Ou era strippers? E o bicho papão ia papar o bebe que estava sozinho no berço, mas só se tivesse acordado! Então dormíamos logo. Mas será que estávamos sossegados? Creio que sonhava com o papaí na roça a noite! Mas eu gostaria de ver o papai subindo no telhado e dando uma surra no bicho papão!

Fico pensando que realmente somos sobreviventes, também para sentirmos o que é um ecochato e ver nossos filhos ou netos não poderem paquerar, pois correm o risco de serem presos por assédio sexual!

Ainda bem que nascemos num tempo que não tinha o “politicamente correto”! Tudo o que fazíamos seria hoje considerado “incorreto”, seríamos presos ou até mortos, talvez pela cuca, pelo bicho papão ou o boi da cara preta, mas esse só de susto!

Somos ou não sobreviventes?

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